Centro de reabilitação. Particular, convênio e internação.
A lei que regulamenta a proteção e os direitos de dependentes químicos e sua internação em centro de reabilitação, estabelece que os portadores de transtornos mentais, como são considerados os dependentes, são assegurados sem qualquer discriminação, inclusive com relação a recursos econômicos.
É preciso respeitar o princípio de igualdade estabelecido pela Constituição Federal, que assegura o direito à saúde. A lei, dessa forma, atinge também os que devem ser encaminhados para internação, seja ela voluntária, involuntária ou compulsória, sendo voltada para instituições públicas e privadas que atuam nesse ramo da medicina.
Ao mesmo tempo, a legislação referente a dependentes químicos estabelece seus direitos, como salientamos a seguir:
- O dependente internado em centro de reabilitação deve ter acesso ao melhor tratamento de saúde, de acordo com suas necessidades;
- O paciente deve ser tratado com respeito e humanidade, buscando alcançar sua recuperação através da reinserção na família, na comunidade e no trabalho;
- O paciente deve ainda ser protegido contra qualquer tipo de exploração ou abuso;
- As informações prestadas sobre o paciente devem ter garantia de sigilo por parte dos responsáveis;
- Os profissionais médicos devem estar presentes para analisar a evolução do paciente;
- O paciente deve ter acesso aos meios de comunicação disponíveis, além de também ter direito a todo tipo de informações sobre seu problema de saúde e o tratamento;
- Os meios utilizados para a recuperação do paciente devem ser os menos invasivos possíveis e o paciente deve ser, preferencialmente, levado a um serviço comunitário de saúde mental.
No entanto, embora os direitos estejam definidos por uma legislação, são poucas as entidades privadas que observam o que está determinado, muitas vezes afrontando os direitos dos pacientes e de seus familiares.
Centro de reabilitação: um direito do dependente químico
Existem inúmeros estudos que apontam os fatores que levam uma pessoa a se tornar dependente químico, como o envolvimento de familiares ou mesmo quando a pessoa não é criada por ambos os pais, além da falta de práticas religiosas, violência doméstica, fatores hereditários ou falta de atenção por parte dos educadores.
O consumo de drogas psicoativas provoca uma série de transtornos mentais, além de desvios de comportamento, havendo, em muitos casos, a necessidade de um período de internação em um centro de reabilitação especializado.
Com relação ao tratamento, a lei também estabelece sobre seguros e planos de saúde, determinando cobertura obrigatória para as doenças consideradas como de transtorno mental na CID 10, a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à saúde.
A CID 10 é uma relação de doenças que ajuda na pesquisa sobre problemas os mais diversos, como monitoramento e incidência de algumas doenças, avaliação da assistência que deve ser prestada e análise das soluções.
Os transtornos mentais e desvios de comportamento estão também previstos nessa listagem. Além dos problemas orgânicos, como as doenças de Alzheimer e de Parkinson, a listagem apresenta problemas de esquizofrenia, transtornos de humor, distúrbios de personalidade, além de muitos outros que são considerados doenças decorrentes do uso de substâncias psicoativas.
Nesse último caso, são relacionados distúrbios provocados pelo consumo abusivo de alucinógenos, hipnóticos e sedativos e múltiplas drogas, além do próprio álcool, que é uma droga lícita, porém causadora de uma série de problemas de saúde.
Nossa legislação estabelece que o paciente portador de transtornos mentais decorrentes do uso de drogas seja atendido em um centro de reabilitação, não podendo haver qualquer limite de tempo para sua internação.
A ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar também apresenta resolução normativa, estabelecendo cobertura sem limite de tempo em todas as formas de internação pelo consumo de drogas.
A internação também chegou a ser tema de uma súmula do STJ – Supremo Tribunal de Justiça, que considera abusiva qualquer cláusula contratual que estabeleça limites de tempo para a internação do segurado. Ou seja, o dependente químico deve ser tratado de acordo com suas necessidades em um centro de reabilitação, independentemente de quanto tempo será necessário para sua recuperação.
Mesmo havendo previsão legal para impedir o tempo determinado pelas seguradoras, muitas delas colocam restrições nesse tipo de atendimento, estabelecendo prazos entre 15 a 30 dias por ano, tomando por base cláusulas contratuais que já se encontram revogadas pelas resoluções normativas da ANS.
É importante, portanto, para segurados de planos de saúde, que qualquer cláusula limitante sobre períodos de internação deve ser considerada nula, uma vez que infringe o artigo 51 do Código de Direito do Consumidor. Esse artigo considera nula qualquer cláusula que leva o consumidor a ter qualquer desvantagem ou que apresente incompatibilidade com a igualdade e a boa-fé do consumidor.
Qualquer cláusula contratual limitante sobre o tempo de tratamento de um dependente químico deve ser considerada abusiva, já que não pode estabelecer quanto tempo é necessário para que um dependente internado em centro de reabilitação seja considerado totalmente recuperado.
A internação e a recuperação desse tipo de paciente vai depender de outros fatores e, dessa forma, uma operadora de plano de saúde não é capacitada para estabelecer prazos para que o doente possa se recuperar. Quem tem essa responsabilidade é somente o médico responsável, que acompanha o paciente.
Também é importante destacar que o limite de tempo de internação em centro de reabilitação é totalmente contrário ao objeto do contrato, ou seja, o cliente fez um contrato para garantir assistência integral e deve ser atendido.
As operadoras, muitas vezes, alegam que existem resoluções de órgãos de saúde que dão respaldo a essa sua exigência, mas uma resolução normativa não é uma lei e, assim, a lei deve ser respeitada antes de qualquer tipo de resolução ou norma.
Além disso, as operadoras de saúde também apresentam outro argumento, informando que, terminado o prazo delimitado pelo contrato para internação, o paciente deve arcar com parte do custo do centro de reabilitação.
Essa exigência também deve ser considerada como nula, uma vez que se trata apenas de uma forma de as operadoras poderem estabelecer um limite de tempo ou ainda de negar o tratamento em um centro de internação, situação que contraria o próprio contrato com elas estabelecido.
Tratamento em centro de reabilitação e equipe multidisciplinar
Devemos considerar um fator bastante preocupante para tratamentos em centro de reabilitação. Ao mesmo tempo em que o número de dependentes químicos vem crescendo nos últimos anos, o tratamento em alguns casos é mais longo do que com outras doenças, exigindo ainda a participação de uma equipe multidisciplinar.
Muito embora as seguradoras apresentem uma série de impedimentos para arcar com o custo do tratamento, a legislação brasileira estabelece que elas são obrigadas a arcar com todos os custos, já que a dependência é considerada um transtorno mental e, portanto, uma doença, incluindo até mesmo os problemas relativos a intoxicações ou abstinência causadas pelo consumo de substâncias entorpecentes.
Dessa maneira, qualquer limitação de tempo ou exigência de participação nos custos de internação em centro de recuperação impostas pelas operadoras devem ser consideradas abusivas e, se não solucionadas diretamente com as operadoras, devem ser levadas à Justiça que, nos últimos anos, vem tomando decisões favoráveis ao consumidor, não restringindo qualquer direito do paciente.
Para ter direito à cobertura do plano de saúde e ser levado a um centro de reabilitação, o paciente deve atender alguns requisitos:
- Ter um atestado médico para sua internação com o número CID da doença;
- Ter cobertura no contrato, com doença que pode ser decorrente das listadas na CID;
- Ter um plano adequado de cobertura, tanto no plano ambulatorial quanto no hospitalar. Havendo necessidade de internação, o plano mais adequado é o hospitalar.
Havendo o plano hospitalar e se o paciente tiver a solicitação médica com o diagnóstico da doença considerada como transtorno mental, a seguradora é obrigada a cobrir todos os custos do centro de reabilitação.
Entende-se, portanto, que qualquer limitação de tempo em centro de reabilitação por uma operadora de saúde deve ser considerada abusiva. Não pode haver um limite de tempo, uma vez que cada paciente deve ter suas condições físicas e mentais respeitadas, devendo ficar sob critério médico o prazo ideal para recuperação do paciente.
Para os familiares de um dependente químico que tenha necessidade de internação e que tenha um plano de saúde, todos os meios devem ser utilizados para que a seguradora cubra integralmente o tratamento até que o médico considere que o paciente pode receber alta e retornar ao meio familiar e às suas atividades profissionais ou escolares.
Lembramos que, em alguns casos, determinadas seguradoras estabelecem que, depois do prazo determinado pelo contrato, geralmente em torno de 30 dias por ano, o segurado deve pagar metade do tratamento.
Em alguns contratos, o prazo pode ser até maior, chegando a 120 dias. Contudo, mesmo assim, é preciso aplicar a regra, não podendo haver qualquer limitação ou redução do valor pago pela seguradora, exigindo que o cliente pague o restante.
Qualquer limitação é considerada ilegal e considerada nula, uma vez que, depois do contrato assinado, o cliente deve ter todas as suas necessidades de saúde atendidas, inclusive em casos de dependência química e de internação em centro de reabilitação.
Havendo necessidade de internação, a solicitação deve ser feita preferencialmente na rede credenciada pela operadora do plano de saúde e, em não havendo um centro de reabilitação, deve-se recorrer a clínicas particulares.
No caso de um plano de saúde que permite o reembolso dos custos, a escolha do paciente pode ser feita através de uma clínica especializada, particular, internando o paciente e solicitando o reembolso no limite previsto pelo contrato.
Nessas situações, havendo limitação do reembolso depois de qualquer prazo estabelecido no contrato é preciso aplicar a mesma regra anterior e o reembolso deve ser feito pelo período integral de internação.
Se, porventura, o plano de saúde não oferece uma clínica especializada em tratamento de dependência química, os familiares podem ainda recorrer à Justiça, exigindo que a operadora pague todo o tratamento em centro de recuperação.
Casos considerados como doenças pré-existentes
Alguns planos de saúde também consideram que a dependência química deve ser tratada como doença pré-existente.
Diante de uma situação como essa é preciso analisar o próprio conceito de doença pré-existente, ou seja, deve ser uma doença que o paciente sabia que tinha quando fez a contratação do plano de saúde e, nesses casos, é necessário aplicar uma carência de 2 anos para sua cobertura.
Devemos, no entanto, considerar que a operadora do plano de saúde é obrigada a fazer um exame em todos os clientes e seus dependentes antes de assinar o contrato, atendendo uma súmula do Tribunal de Justiça de São Paulo, que considera que uma doença não pode ser considerada pré-existente se não foi constatada no exame médico admissional.
Mesmo em casos em que o cliente costuma beber ou tenha apresentado quadros depressivos antes de contratar o plano, não se pode considerar que seja uma doença pré-existente.
Como proceder se o plano de saúde não cobre a internação
Quando o plano de saúde se recusa a pagar o tratamento em centro de reabilitação, os familiares podem recorrer à ANS para buscar a solução do problema. No caso de a ANS não resolver ou demorar muito tempo, os familiares devem acionar a Justiça para obrigar a seguradora a cobrir os custos de internação.
A intervenção da ANS não é obrigatória, uma vez que os familiares podem recorrer diretamente à Justiça, procurando um advogado especialista em planos de saúde e conseguindo uma limitar para obrigar a operadora a cobrir o tratamento integral.
Em alguns casos, quando existe um atestado médico de urgência, a Justiça pode conceder a liminar no mesmo dia.
Os familiares devem apenas ter o cuidado de não fazer qualquer pagamento, uma vez que alguns juízes entendem que, quando os familiares estão pagando a internação, a saúde do paciente não se encontra mais em situação de risco e, nesse caso, não concedem a liminar, sendo necessário fazer o pagamento do tratamento integral, independentemente de sua duração, podendo depois fazer a solicitação de reembolso à operadora do plano de saúde.
Entende-se, portanto, que a melhor solução é procurar fazer valer todos os direitos do cliente, evitando uma série de problemas para com a operadora do plano de saúde no futuro.
Internação em centro de reabilitação pelo SUS
O tratamento da dependência química feito através de um centro de reabilitação é o melhor caminho para recuperar o usuário compulsivo. Mesmo havendo uma série de clínicas particulares, para quem depende do SUS – Sistema Único de Saúde, há uma grande dificuldade em encontrar o local apropriado.
Devemos salientar, nesse caso, que a internação do dependente químico é um direito do paciente, embora não seja uma recomendação para todo e qualquer usuário de substâncias psicoativas.
Depois da lei da Reforma Psiquiátrica, o foco de internações em centro de reabilitação mudou para o atendimento ambulatorial, que não exige a internação. Para a legislação, a internação é uma opção para pacientes que estejam em condições mais graves ou correndo qualquer tipo de risco ou causando riscos a outrem, além de pessoas que tenham tido overdose ou que não conseguiram recuperação por outros métodos de tratamento.
Embora seja possível, no entanto, a internação através do SUS em um centro de reabilitação não é simples e, além disso, mesmo nos casos de maior urgência, existe o problema de falta de vagas em algumas cidades.
Lembramos que o fato de não haver vagas ou a dificuldade em internar o paciente não deve ser encarada como obstáculo intransponível.
A primeira coisa a fazer para conseguir internação em centro de reabilitação pelo SUS é procurar um CAPS – Centro de Atenção Psicossocial. No caso de não haver um CAPS na cidade, é preciso procurar um posto de saúde, fazendo uma consulta com um médico psiquiatra.
O usuário compulsivo deve passar pela avaliação e ser encaminhado para tratamento. Não sendo a primeira vez que a situação acontece, como no caso de haver sido atendido em outra localização, os familiares devem levar o histórico médio e outros documentos para que o dependente possa ser tratado.
Muitas vezes, no entanto, mesmo tendo todos os requisitos para internação em centro de reabilitação, o tratamento pode ser negado pelo SUS e, nesse caso, os familiares podem recorrer à Justiça ou procurar uma instituição filantrópica.
As instituições filantrópicas oferecem tratamento gratuito a dependentes químicos, recebendo seus recursos financeiros de doações. Em algumas delas, existe a cobrança de uma espécie de mensalidade, havendo ainda aquelas que oferecem vagas para pacientes que passaram por uma avaliação médica e social.
Os familiares também podem recorrer à Justiça para encontrar uma vaga através do SUS, procurando a Defensoria Pública, onde serão levados em consideração o histórico médico do paciente e a renda familiar antes da internação em clínica de dependentes químicos, mas esse processo pode demorar até meses.